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Home → Blog → Como não falar sobre transtornos alimentares – mais do mesmo no filme “O mínimo para viver" (To The Bones)

Como não falar sobre transtornos alimentares – mais do mesmo no filme “O mínimo para viver" (To The Bones)

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Há algum tempo alguém postou o trailer do filme “O Mínimo Para Viver” (To The Bones), que está prestes a ser lançado pela Netflix, que conta a história de uma jovem com anorexia nervosa.

Os dois minutos e meio de trailer não podiam ser, para mim, mais perturbadores: cena após cena, segue-se uma sequência de situações que se encaixam no padrão habitual da descrição da anorexia pela grande mídia, e que viola quase todas as diretrizes para mídia da NEDA – Associação Nacional de Transtornos Alimentares dos EUA (que podem ser consultadas em https://www.nationaleatingdisorders.org/responsible-media-coverage-eating-disorders): contagem de calorias, cenas que retratavam em detalhes gráficos comportamentos sintomáticos da personagem com relação a exercícios e alimentação, e detalhes de seu corpo excessivamente emagrecido.

Sendo pesquisadora e ativista na área desde 2001, e sobrevivente de um transtorno alimentar que controlou minha vida por cerca de oito anos, há muito tempo me preocupo não apenas com a falta de conhecimento adequado sobre transtornos alimentares tanto entre profissionais de saúde quanto para o público geral, mas especificamente com a questão da mídia – no tocante à promoção de um padrão de beleza feminino excessivamente magro, que não é alcançável nem saudável para a maioria das mulheres, e também no tratamento sensacionalista dado à questão dos transtornos alimentares.

Houve todo um frisson na internet a respeito do filme em questão, e marketing pesado no sentido de ressaltar seu possível papel na conscientização sobre o tema. Minha apreciação, assim como a de algumas outras pessoas, ressalta outro aspecto: os riscos.

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Não se faz prevenção de transtornos alimentares descrevendo as características dos transtornos, pois isso tende a causar mais danos do que benefícios, como observado em Estudos como o de Mann et al 1997 e Carter et al 1997 há mais duas décadas. Ao contrário, os programas mais bem sucedidos focam em aceitação corporal e crítica ativa ao padrão de beleza (ver, p. ex., Stice, Shaw & Marti 2007 e Shaw, Stice & Becker 2009).

A razão para isso é muito simples: os transtornos alimentares, e a anorexia principalmente, são chamados pelos médicos de ego-sintônicos. Em outras palavras, a pessoa se identifica com os comportamentos sintomáticos do transtorno, ela não os vê como um problema. Ao contrário: ela está convencida de que são necessários, e até mesmo o melhor que pode fazer por si naquele momento. Assim, não é de se espantar que diante da magreza extrema da personagem principal, pessoas com transtornos alimentares ou que se aproximam disso sintam-se impelidas a investir mais esforços para perder peso. Isso é particularmente complicado em uma cultura que valoriza a magreza a qualquer preço, em que mulheres de todos os tamanhos se sentem mal sobre seus corpos após folhear revistas femininas (Hamilton, Mintz e Kashubeck-West, 2007) e em que 47% meninas adolescentes participantes de um estudo relataram que desejavam perder peso em função das fotos nas revistas (Field et al, 1999).

Tentar combater transtornos alimentares com imagens como as que aparecem nesse trailer equivale a lutar contra o alcoolismo mostrando pessoas bebendo. O apelo dos comportamentos retratados será maior do que qualquer advertência sobre seus riscos ou males.

Algumas coisas que vim saber depois a respeito do filme me incomodam ainda mais: a atriz, que tem histórico de transtorno alimentar, precisou perder peso para o papel. E mesmo reconhecendo a existência de fortes evidências científicas que entrar em déficit energético e/ou perder peso pode tornar pessoas com histórico de anorexia muito mais propensas a reincidir, uma organização de apoio à recuperação aos transtornos alimentares ainda assim decidiu apoiar o filme, alegando que a “decisão criativa (sic) dos cineastas” sobre a perda de peso foi tomada antes de firmarem a parceria. Em seu próprio site, a organização também admitiu que recomenda cautela às pessoas enfrentando transtornos alimentares. De fato, já é possível encontrar imagens do filme com a personagem principal sendo mencionadas como fonte de inspiração para emagrecimento.

Como é possível que mesmo cientes de todos os riscos, os envolvidos escolheram produzir e apoiar este filme desta forma?

Aparentemente, há uma tendência recente que parece acreditar que não existe publicidade ruim. O recente caso de uma série sobre suicídio que continha uma série de elementos que sabidamente aumentam o risco de comportamento suicida é curiosamente similar. Assim como o filme, o seriado também tinha uma parceria com uma organização voltada para a prevenção do suicídio. Argumenta-se, sem base em dado algum, que o benefício da suposta conscientização gerada pode ser maior do que o mal que possam causar. Seria perfeitamente possível fazer um filme sobre o assunto sem mostrar esses detalhes, enfatizando outros aspectos: esse mal não é um “efeito colateral” necessário. Mas talvez, sem o elemento do choque, da sensacionalização, e mesmo da polêmica gerada pelas críticas negativas, ele não alcançasse tanta audiência.

Em função do meu trabalho, a publicidade direcionada pelos algoritmos das empresas que observam meus hábitos na internet é predominantemente voltada para a indústria do emagrecimento (para não mencionar os riscos dessa publicidade para pessoas vulneráveis a transtornos alimentares). Uma das formas de publicidade frequente é uma chamada que imita uma reportagem, mas na verdade é um anúncio. A falsa manchete anuncia o “perigoso emagrecimento” de um ator de televisão, com uma fotografia de um ator conhecido que perdeu bastante peso. O anúncio é de um suplemento que supostamente auxilia o emagrecimento. A existência de uma publicidade como essa atesta que falar em “emagrecimento perigoso” não apenas atrai, como atrai para o desejo de emagrecer.

Eu argumentaria que certos tipos de mal deveriam ser evitados a todo custo. Minha bulimia começou na tarde em que assisti na televisão um filme que retratava a história de uma mulher com o transtorno. Talvez, se eu não tivesse assistido ao filme, eventualmente desenvolvesse bulimia de outra forma. Mas eu nunca vou saber. Eu gostaria que outras pessoas que hoje estejam na mesma posição suscetível em que eu me encontrava naquela época tivessem essa oportunidade.

 

Referências:

Carter JC, Stewart DA, Dunn VJ, Fairburn CG. (1997) Primary prevention of eating disorders: might it do more harm than good? Int J Eat Disord. 1997 Sep;22(2):167-72.

Field AE, Cheung L, Wolf AM, Herzog DB, Gortmaker SL, Colditz GA. (1999). Exposure to the Mass Media and Weight Concerns Among Girls. Pediatrics. March 1999, VOLUME 103 / ISSUE 3.

Hamilton EA, Mintz L, Kashubeck-West S. (2007). Predictors of Media Effects on Body Dissatisfaction in European American Women. Sex Roles, 2007, Volume 56, Number 5-6, Page 397.

Mann T, Nolen-Hoeksema S,,Huang K, Burgard D, Wright A, Hanson K. (1997) Are two interventions worse than none? Joint primary and secondary prevention of eating disorders in college females. Health Psychology, Vol 16(3), May 1997, 215-225. http://dx.doi.org/10.1037/0278-6133.16.3.215

Shaw H, Stice E, Becker CB. (2009) Preventing eating disorders. Child Adolesc Psychiatr Clin N Am. 2009 January ; 18(1): 199–207. doi:10.1016/j.chc.2008.07.012.

Stice, E; Shaw H; Marti, CN. A meta-analytic review of eating disorder prevention programs: encouraging findings. Annu Rev Clin Psychol. 2007;3:207-31. DOI:10.1146/annurev.clinpsy.3.022806.091447

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